O que já se sabe sobre a moeda única do Mercosul
O real vai acabar? Confira o que já se sabe sobre a moeda única para os países-membros do Mercosul.
Publicado em: 14 de julho de 2023.
Autor: Sâmia Frantz
A discussão sobre a moeda única do Mercosul não é nova, mas voltou aos holofotes em 2023, quando Brasil e Argentina assinaram um memorando de intenções. Mas o que já se sabe sobre essa moeda? Seria o fim do real?
Neste artigo vamos tirar essas e outras dúvidas, além de mostrar o que significa na prática haver uma moeda única do Mercosul.
O que já se sabe sobre a moeda única do Mercosul
A ideia de criar uma moeda conjunta para os países que compõem a América Latina remonta aos anos de 1980. Embora há 40 anos se mencione o tema aqui e ali, as discussões só viriam a se acentuar no fim dos anos 1990, quando o euro foi implementado na União Europeia num formato muito parecido com aquele que se imagina para os países do Mercosul. Porém, o assunto nunca passou de especulação.
Talvez até agora.
No início de 2023, os governos do Brasil e da Argentina passaram a discutir o uso de um Fundo de Garantia à Exportação (FGE) para assegurar linhas de crédito em operações de importação argentinas de produtos brasileiros. No memorando assinado para oficializar o acordo, veio à tona a ideia de se criar uma moeda comum de uso dos dois países para atender aos negócios bilaterais entre eles.
Para que isso seja possível, o governo brasileiro aprovou a constituição de um grupo de trabalho que vai se dedicar a estudos técnicos sobre a viabilidade dessa moeda. A ideia é criar um instrumento que facilite o comércio sem entraves entre Brasil e Argentina e dinamize as relações entre ambos, facilitando o fluxo das transações.
Embora a tratativa seja restrita aos dois vizinhos, ela talvez possa ser o passo que faltava para a criação de uma moeda de circulação sul-americana. Afinal, a experiência criada com a moeda bilateral entre Brasil e Argentina pode servir como incentivo para operações comerciais entre outros países do bloco – e até como boa prática de gestão monetária, inflação e sustentabilidade da relação fiscal e ambiental, por exemplo.
No entanto, ainda não é possível afirmar que isso vá de fato acontecer, pois a existência de uma moeda bilateral não está condicionada a uma moeda única do Mercosul.
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Como funcionaria uma moeda única do Mercosul
Pouco se sabe como funcionaria a moeda única do Mercosul, já que ainda não existe nenhum estudo técnico iniciado sobre o tema. Porém, em 40 anos de debates algumas intenções já foram reveladas – especialmente, entre Brasil, Argentina, Paraguai e Chile.
A principal: a moeda única do Mercosul não iria ameaçar o real, ao contrário do que muita gente pensa. Na verdade, ela sequer entraria em circulação. Ninguém precisaria ir até o banco trocar notas, nem pagar as compras do mercado do mês com um dinheiro físico novo. A moeda única do Mercosul não seria usada pela população.
A ideia é que a nova moeda seja utilizada apenas para transações comerciais e financeiras entre países do Mercosul, o que traria muitas vantagens aos países do bloco.
Ela poderia contribuir, por exemplo, para a redução da dependência dos países latinos ao dólar, que hoje domina as transações entre eles e pressiona as moedas dos emergentes. Na prática, isso ainda ajudaria o comércio local a se livrar das flutuações cambiais.
Cada um dos países do bloco, portanto, poderia manter sua própria moeda para uso interno.
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Principais desafios para a criação de uma moeda única do Mercosul
Criar uma moeda única para uso dos países do Mercosul não é algo que aconteceria da noite para o dia. Seria preciso muito estudo e análise prévia para avaliar as possibilidades e limites de utilização.
Embora ainda não se tenha uma diretriz, já é possível enumerar dificuldades e perspectivas que ela traria. Entre os principais motivos apontados como obstáculos para o avanço desse plano estão:
- ● o tamanho das economias locais dos países-membros do bloco econômico;
- ● as diferenças econômicas discrepantes entre os países da América do Sul;
- ● a fragilidade econômica de todo o bloco diante do mercado internacional;
- ● o papel dos bancos centrais de cada um;
- ● a interferência de questões envolvendo política monetária e negociações diplomáticas;
- ● a necessidade de se criar uma autoridade monetária regional para regular a emissão da moeda, tal como acontece com o Banco Central Europeu.
Por outro lado, as vantagens passam especialmente pela redução do uso de uma moeda (o dólar) de um terceiro país que sequer faz parte do comércio do Mercosul. Com isso, todos os países do bloco ficam condicionados à política monetária norte-americana, que é quem determina sua taxa de juros em função de questões domésticas, como nível de inflação e atividade econômica.
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A experiência das moedas únicas no mundo
O uso de uma moeda única não é novidade no mundo. O exemplo mais conhecido é o euro, adotado por 20 dos 27 países-membros da União Europeia – o mais recente deles a Croácia, que passou a usar a moeda em 1º de janeiro de 2023. O euro foi oficialmente implantado em 1999 e substituiu moedas locais como o marco alemão, franco francês, peseta espanhola, lira italiana e florins holandeses, entre outros.
Outro exemplo é o continente africano, que adota o franco CFA (Comunidade Financeira Africana). O franco CFA é dividido entre duas moedas intercambiáveis:
- ● XAF – adotada por seis países da África Central, como República do Congo e Camarões;
- ● XOF – usada por oito países da África Ocidental, como Costa do Marfim e Senegal.
Quase todos esses 14 países, no entanto, são ex-colônias francesas e adotaram a opção única para substituir as moedas usadas durante a colonização europeia.
Além destes, há também o dólar do Caribe Oriental, adotado por oito países. Ele é indexado ao dólar, com uma taxa de câmbio fixa.
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